A Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa) se uniu à Syngenta, parceira do programa Sou de Algodão, para a realização de um debate virtual sobre o cenário atual da cultura e as expectativas para o futuro do mercado. O chamado Cotton Connection reuniu, na última sexta-feira (21), diversos especialistas em torno do tema "das lavouras brasileiras para o mundo".
O panorama mundial é de forte demanda por algodão, com expectativa de crescimento no próximo ano. Os pacotes de resgate e a retomada da atividade econômica em diversos países fizeram com que os preços na bolsa de Nova York saltassem de 45 cents/libra, no ano passado, para 95 cents/libra. Para o analista de mercado Pedro Dejneka, sócio da MD Commodities, a questão a ser debatida é como os cotonicultores brasileiros se posicionarão neste cenário.
A previsão para a safra americana é de 3,7 milhões de toneladas, o que tem mantido os preços em torno de 80 cents/libra. Caso o clima favoreça, porém, Dejeneka alerta que a produção dos Estados Unidos pode chegar a 4,2 milhões, com estoque final acima de 1 milhão, o que derrubaria as cotações. "Se voltar a chover com mais regularidade no Texas, vai ser muito difícil sustentar preços nos níveis que estão. Podemos, facilmente, ficar abaixo de 75 cents em dezembro/21, o que levaria dezembro/22 para a casa dos 65 cents/libra", ponderou.
O analista ressaltou, ainda, que a cotação atual, entre 80 e 90 cents/libra, está muito próxima do topo histórico, o que representa uma excelente oportunidade de trava. "O mercado de commodities está extremamente volátil. Estejam cientes disso e trabalhem sua gestão de risco e preservem seu fluxo de caixa", aconselhou. "É preciso ter coragem para agir de forma flexível e agressiva, mas com cautela para preservar a sustentabilidade do seu negócio", concluiu.
A produção brasileira de algodão dobrou nos últimos quatro anos, chegando a 3 milhões de toneladas na safra 2019/2020. Mas ainda há muito espaço para crescer, assegurou o presidente da Abrapa, Júlio Cézar Busato. Para isso, segundo ele, é necessário melhorar a rentabilidade da pluma brasileira. "Na Ásia, em média, vendemos o algodão brasileiro entre 400 e 450 pontos abaixo dos nossos colegas americanos", afirmou. Na prática, isso significa que o Brasil está deixando de ganhar R$ 1 bilhão por ano. "Temos qualidade, rastreabilidade e estamos dando um show em sustentabilidade, mas agora entramos numa briga de "cachorro-grande" e os produtores têm que fazer o dever de casa", disse Busato. A missão é conquistar maior confiabilidade e credibilidade do algodão brasileiro, por meio de cresscente qualidade e transparência de todo o setor. "Não adianta um produtor, por maior que seja, melhorar sozinho a qualidade do seu algodão. Temos que fazer isso juntos", enfatizou.
Para promover a pluma brasileira no exterior e caminhar rumo ao topo do ranking mundial de exportadores, a Abrapa lançou, em 2020, o projeto Cotton Brazil, em parceria com o governo brasileiro e as tradings. As ações são focadas na indústria, especialmente a asiática, destino de 99% das exportações brasileiras de algodão.
Marcelo Duarte, representante da Abrapa em Singapura, falou sobre a importância de se compreender as peculiaridades de cada mercado e trabalhar a percepção da fibra brasileira. "Pesquisas mostram que a imagem do Brasil ainda é aquém da qualidade do algodão que produzimos", conta. Segundo ele, a característica mais valorizada pelos compradores é comprimento de fibra e, neste quesito, a pluma brasileira é muito superior à norte-americana – nossa principal concorrente.
Além da qualidade, os clientes asiáticos valorizam uniformidade dos lotes, agilidade de entrega e transparência nas informações de lotes e fardos. "Este último ponto é onde o Brasil mais perde para os Estados Unidos, está relacionado à confiança e temos que melhorar para conseguir uma melhor remuneração", avalia Duarte.
O mercado doméstico também é prioritário para a Abrapa. O Brasil continua sendo o maior cliente do algodão brasileiro, com um consumo de aproximadamente 700 mil toneladas por safra. As ações de promoção no mercado interno são desenvolvidas por meio do projeto Sou de Algodão. Silmara Ferraresi, assessora da presidência da Abrapa e gestora do movimento, contou que a iniciativa foi lançada em 2016 para conversar diretamente com o consumidor final e incentivar a moda responsável e o consumo consciente. O projeto já conta com cerca de 550 parceiros de toda a cadeia têxtil. "Queremos agregar alto valor ao algodão brasileiro. A gente não vende necessariamente só commodity quando o consumidor final entende e procura pelo que você entrega, e nós entregamos algodão com qualidade, rastreado, certificado e produzido de forma responsável", pontuou.
Antonio Carrere, diretor de Planejamento Estratégico da John Deere, reiterou que o consumidor quer produtos sustentáveis e rastreabilidade. Ele elogiou o trabalho que vem sendo feito pelos produtores brasileiros, na busca pelas melhores tecnologias ao redor do mundo. "Uma grande oportunidade para os produtores se tornarem ainda mais produtivos, eficientes e rentáveis é via geração de dados", afirmou, frisando a necessidade do Brasil avançar na conectividade do campo.
Walter Horita, presidente do Grupo Horita, destacou a visão de futuro e o planejamento do setor, conduzido pela Abrapa com grande engajamento dos produtores. "Tudo veio acontecendo ao seu tempo. Não poderíamos avançar em projetos de promoção sem antes avançar na produção", afirmou. Horita acredita que, em cinco anos, o Brasil se tornará o maior exportador mundial de algodão. "Se o mercado permitir, vamos passar os Estados Unidos e talvez, também, nos tornar o terceiro maior produtor de algodão do mundo. Para isso, basta um acréscimo de 500 a 700 mil hectares de acréscimo na área brasileira, o que é muito fácil acontecer", completou.
Na avaliação de Matthias Koenig, diretor de negócios da plataforma Nutrade da Syngenta, o sucesso da cotonicultura brasileira no mundo depende da produtividade e da qualidade da lavoura e da reputação do nosso sistema de produção. "Para acelerar essa jornada é preciso parceiros com vontade de assumir riscos e investir", disse. Neste sentido, a Syngenta reafirmou seu compromisso com o crescimento do setor algodoeiro. "Somos incansáveis no desenvolvimento de novas tecnologias, para ajudar o produtor brasileiro nessa caminhada e podermos ganhar dos Estados Unidos em todo os quesitos de qualidade", afirmou o diretor Comercial da empresa, Luciano Daher.
Cotton Connection
Como grande parte dos segmentos, a cotonicultura foi fortemente afetada pela pandemia de Covid-19. O primeiro impacto foi a queda na demanda e, consequentemente, nos preços da commodity. Toda a cadeia precisou se reorganizar e se adequar ao novo cenário. Nesse contexto, surgiu a ideia do Cotton Connection: um fórum para as principais lideranças do algodão debaterem desafios e perspectivas do setor. O sucesso da primeira edição levou a Syngenta a incorporar o evento ao calendário anual da empresa.