A Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa) participou do Simpósio Better Cotton Grandes Fazendas 2024 – “Defendendo as Fibras Naturais na Era da Regulamentação”, realizado virtualmente, em 19 de novembro. O evento internacional reuniu mais de cem produtores licenciados à Better Cotton (BC) de diversos países para discutir estratégias de comunicação que fortaleçam a imagem do algodão como uma fibra natural, destacando a importância de unificar esforços globais frente à concorrência dos sintéticos e ao aumento das regulamentações ambientais.
Alan McClay, CEO da Better Cotton, destacou a relevância do evento para o calendário da entidade. “As grandes fazendas têm um papel central no programa BC, sendo responsáveis por 63% da produção licenciada pela entidade nos últimos anos. Elas oferecem não apenas escala para avanços sustentáveis, mas também oportunidades únicas de inovação e transformação”, afirmou.
Durante a reunião, foi destacada a necessidade de reforçar a comunicação sobre o impacto positivo social e sustentável que envolve a produção do algodão em todo o mundo. Com foco na conscientização do consumidor final, os participantes defenderam um esforço global para unificar mensagens e fortalecer a imagem da fibra natural frente à concorrência crescente com o poliéster e outros sintéticos.
Dilemas Globais e Avanços Regionais
Os desafios enfrentados por produtores de diferentes países, como Brasil e Estados Unidos, incluem o aumento dos custos de produção, a pressão regulatória, principalmente da União Europeia (UE), e a necessidade de competir com fibras sintéticas mais baratas no mercado. Enquanto o algodão é uma fibra biodegradável e colabora com o meio ambiente se produzida de forma responsável, sua competitividade é ameaçada pela atual metodologia da UE para etiquetagem de têxteis como sustentável, conhecida como PEF (Product Enviromental Footprint ou pegada ambiental do produto em português). A calculadora do PEF, atualmente em discussão no parlamento europeu, claramente beneficia os produtos sintéticos, por não considerar a produção de microplásticos, os resíduos plásticos e as fibras naturais como biodegradáveis.
“No Brasil, 82% das propriedades produtoras de algodão já possuem certificações de boas práticas ambientais, sociais e trabalhistas. Mas precisamos comunicar isso de forma constante e impactante, especialmente para consumidores de mercados exigentes como a União Europeia”, ressaltou Márcio Portocarrero, diretor executivo da Abrapa.
Shane Stephen, da Staplcoton (cooperativa de algodão dos EUA), enfatizou o valor do algodão como uma cultura de rotação que beneficia tanto a saúde do solo quanto a economia agrícola local. Ele também alertou para o impacto ambiental do poliéster e destacou a importância de contar a história do algodão de maneira autêntica e acessível: "Precisamos que as pessoas entendam que o algodão é uma alternativa sustentável às fibras sintéticas. O trabalho que nossos agricultores realizam hoje é incrivelmente mais avançado do que há décadas, e essa informação não tem chegado ao consumidor final.”
Plano de Comunicação Global
Entre as soluções discutidas, a criação de uma estratégia global de comunicação contínua foi apontada como prioridade. Essa abordagem envolveria a colaboração entre países produtores e organizações como a Better Cotton, com foco na educação e conscientização sobre os benefícios ambientais e sociais das fibras naturais, em especial o algodão.
Portocarrero comparou a iniciativa a movimentos ambientais no Brasil que, décadas atrás, integraram a temática de preservação ao ensino escolar, formando gerações mais conscientes. Ele destacou que uma campanha de longo prazo, voltada para consumidores e jovens, é fundamental para combater a influência de grupos com maior poder financeiro, como as indústrias petroquímicas que promovem o poliéster.
“Make the Label Count”
A campanha Make the Label Count destaca-se na defesa das fibras naturais diante das mudanças regulatórias promovidas pela União Europeia (UE), que introduziu critérios dentro do “green deal Europeu”. Apesar de avaliar 16 categorias de impacto ambiental, a metodologia Environmental Footprint (PEF) exclui benefícios cruciais das fibras naturais, como biodegradabilidade e a não produção de microplásticos, favorecendo assim materiais sintéticos como o poliéster. A iniciativa tem promovido ações estratégicas, como reuniões políticas e a participação de consultas públicas em Bruxelas, para aprimorar o PEF e garantir uma avaliação justa das fibras naturais. “Defendemos comunidades rurais, biodiversidade e o futuro da moda sustentável”, afirma Elizabeth van Delden, advogada de fibras naturais.
Controle biológico
Durante o evento, foi apresentado um caso de sucesso de um produtor do Paquistão, que demonstrou como a adoção de controles biológicos pode reduzir os custos com pesticidas químicos. O debate destacou os desafios e avanços no uso de biopesticidas na produção de algodão, especialmente no Paquistão, onde ainda há limitações quanto à disponibilidade comercial e à aplicação em larga escala.
Robério Carlos dos Santos Neves, engenheiro agrônomo do Instituto Goiano de Agricultura (IGA), apresentou uma abordagem detalhada sobre o manejo integrado de pragas (MIP) na cultura do algodão, com destaque para o monitoramento e controle de pragas como trips, pulgão, mosca-branca, lagartas e, especialmente, o bicudo-do-algodoeiro.
Foram destacadas estratégias como o uso de armadilhas, controle biológico com fungos e o manejo preventivo para reduzir populações de pragas-chave. O bicudo permanece como o maior desafio devido às opções limitadas de controle biológico. No entanto, avanços em estudos com fungos e parasitoides oferecem perspectivas promissoras.
O futuro do algodão
Os participantes concluíram que o algodão possui desafios significativos e similares para todos os países produtores. A união de esforços globais, o fortalecimento da imagem da fibra e o enfrentamento à concorrência com base em evidências científicas são caminhos indispensáveis para garantir sua relevância e manutenção no mercado nos próximos anos.