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Brasil vira líder em algodão e busca novas rotas para exportar

11 de Outubro de 2024

Com o Brasil na posição de maior exportador global de algodão, superando os EUA, comercializadores e transportadores vêm buscando rotas alternativas para driblar os gargalos na hora de escoar a produção, em busca de opções ao Porto de Santos, a principal porta de saída para o exterior.


Uma delas, proposta pela Brado, operadora logística do Grupo Cosan, passa pelo Rio, via Porto de Itaguaí. Outras alternativas são uma rota pelo Porto de Fortaleza, no Ceará, testada pela gigante americana Cargill, e o Porto Itapoá, terminal privado no litoral de Santa Catarina. Elas se somam a um terminal operado pela Wilson, Sons, no Porto de Salvador, na Bahia.


Uma particularidade do algodão torna ainda mais complexo buscar rotas alternativas a Santos. A pluma é transportada em contêineres, mais usados para bens industriais, diferentemente da soja e do milho, que vão em navios graneleiros. Como o transporte de contêineres é encadeado, os operadores embarcam as exportações que usam esses equipamentos nos mesmos portos por onde eles chegam. No Brasil, a chegada de contêineres é concentrada na importação de produtos industriais e no Sudeste, dada a proximidade dos parques fabris e dos mercados consumidores. Por isso, transportadores marítimos tendem a preferir Santos, em vez das saídas alternativas.


Atrasos geram multas


Mesmo assim, a diversificação é necessária porque a produção crescente está lotando a rota tradicional, dizem produtores, comercializadoras e operadores logísticos. Segundo a Associação Nacional de Exportadores de Algodão (Anea), 90% das exportações chegam aos portos pelo transporte rodoviário, e o Porto de Santos embarca 95% da carga.


" Santos está praticamente com a capacidade tomada. É difícil chegar caminhão " diz Orcival Guimarães, vice-presidente da Associação Mato-grossense dos Produtores de Algodão (Ampa).


Segundo Guimarães, sócio da Boa Esperança Agropecuária, que produz algodão em 33,8 mil hectares em seis cidades no entorno de Lucas do Rio Verde (MT), as alternativas evitam aumento de custo com a logística. Como as cotações de algodão, soja e milho " que também são plantados pelos coticultores " estão em queda, gastos a mais com o transporte reduzem as margens de lucro, diz o produtor:


" Já não temos margens, chegamos ao limite. Quando temos rotas alternativas, não pagamos multas por atraso de entrega. Não podemos perder a confiança que adquirimos no mercado externo, que confia no nosso algodão porque cumprimos os contratos.


A Brado Logística já usa ferrovias para escoar via Santos. Os fardos chegam de caminhão a seu terminal de Rondonópolis, sul de Mato Grosso, vindos de fazendas localizadas num raio de até 800 quilômetros. Lá, são embarcados nos contêineres. A carga segue em trilhos da Rumo (também do Grupo Cosan) até Santos, um trajeto de 1,6 mil quilômetros.


Na rota alternativa, testada em julho, os contêineres pegam, na reta final, outra ferrovia, da MRS Logística, até o Porto de Itaguaí, na Baía de Sepetiba. O trajeto fica em quase 2 mil quilômetros. Na operação de julho, a carga embarcou em navio da transportadora Maersk, para Bangladesh.


" No Porto de Santos, o trem de contêiner não acessa a área primária, acessa uma área secundária. A partir dela, fazemos a distribuição, de caminhão, para o terminal primário. O Porto de Sepetiba suporta o nosso trem dentro da área primária. Em termos de competitividade, é muito interessante " afirma Vinícius Cordeiro, gerente executivo comercial da Brado.


O plano é escoar, de forma regular a partir daí, mil toneladas de algodão por semana via Itaguaí. Isso equivale a 10% do algodão transportado anualmente pela operadora.


Segundo Cordeiro, a infraestrutura permitiria ampliar a movimentação em três vezes, mas isso dependerá da demanda dos exportadores e dos transportadores marítimos " já que, por causa da dinâmica da chegada dos contêineres, esses operadores tendem a preferir Santos.


 

Via até por Santa Catarina


Para a Cargill, dona da carga escoada em julho por Itaguaí, é positivo ter "alternativas de transporte multimodal, chegando a diferentes portos", diz, em nota, Paulo Sousa, presidente da companhia no Brasil.


A gigante americana do agronegócio já havia testado outra alternativa. No fim de junho, embarcou cem toneladas pelo Porto de Fortaleza, onde os fardos, vindos da região oeste da Bahia, chegaram de caminhão.


A Bahia é o segundo maior produtor do país " responde por quase 20% do total, ante os 70% de Mato Grosso. O oeste baiano está a 1,5 mil quilômetros de Fortaleza e a mil quilômetros do Tecon Salvador, operado pela Wilson, Sons, que já exporta algodão para Paquistão, Bangladesh, China, Indonésia, Vietnã e Turquia, os principais fabricantes da indústria têxtil global.


Ao sul de Santos, o Porto Itapoá, terminal privado no litoral de Santa Catarina, a 250 quilômetros de Florianópolis, surge como alternativa, fazendo embarques de algodão desde o fim do ano passado. Após obras para ampliar o armazém do terminal de contêineres, concluídas no início do ano, o porto separou uma área para o algodão. Apesar da distância das regiões produtoras, o terminal oferece custos menores.


" Nosso maior gargalo é a falta de logística " conclui o produtor Guimarães, da Ampa. " A produção aumentou não tanto pelo momento de área, mas a produtividade, através de tecnologia, estourou. Produzimos muito mais do que há dez ou 15 anos, e a logística andou muito pouco.


A produção brasileira de algodão dobrou na comparação com uma década atrás, resultado de anos de investimentos em tecnologia, seleção de sementes e certificação de qualidade, num modelo acoplado ao cultivo de grãos " o algodão é plantado em "segunda safra", após a colheita da soja.


 

Mais recordes à vista


Na safra 2023/2024, encerrada em agosto, a produção de algodão em pluma atingiu 3,654 milhões de toneladas, segundo a Conab, estatal do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), alta de 15% sobre a safra anterior, que já havia sido recorde.


Com isso, o Brasil se tornou o terceiro maior produtor global, atrás de China e Índia, conforme o Departamento de Agricultura dos EUA (USDA, na sigla em inglês, equivalente a ministério americano). Como esses países destinam sua produção para as indústrias têxteis locais, não são exportadores, como Brasil e EUA.


As vendas de algodão ocorrem nos 12 meses seguintes ao término da colheita, após o beneficiamento inicial " que separa o caroço, usado para fazer óleo de cozinha, da pluma. Por isso, os recordes de exportação costumam vir no ano seguinte aos de produção. Os embarques se concentram no segundo semestre.


Na safra 2023/2024, as vendas externas somaram 2,586 milhões de toneladas, salto de 85% ante a safra anterior, segundo a Anea. Na safra 2024/2025, a associação projeta exportações de 2,850 milhões de toneladas, novo recorde. A primeira estimativa da Conab para a produção de 2024/2025 aponta alta de 1%, sugerindo que as rotas de escoamento seguirão abarrotadas.

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