A temporada 2023/24 pode ser um novo divisor de águas para a cotonicultura brasileira. O país não só conquistou o título de maior exportador mundial de algodão, meta que o setor só esperava atingir em 2030, mas também alcançou um cliente de alto gabarito que pode ajudar ainda mais na estratégia de divulgação da qualidade da pluma brasileira.
Com mercado aberto em janeiro de 2023 e negócios iniciados há cerca de 10 meses, o Egito já é o nono destino das exportações brasileiras. O volume não é expressivo. Foram 17,9 mil toneladas neste ciclo, com receita de US$ 32,7 milhões. A China, o maior cliente, comprou mais de 1,3 milhão de toneladas de algodão brasileiro.
Mas a chancela egípcia é um diferencial dos produtores brasileiros em relação aos outros grandes exportadores mundiais. Famoso pela referência da qualidade do “algodão egípcio”, uma fibra extralonga, o Egito procura no Brasil um parceiro confiável e duradouro para o fornecimento da pluma a longo prazo, já que a produção local não tem como se expandir.
Com o interesse dos industriais egípcios pelo algodão brasileiro em alta, a demanda deve dobrar no ciclo 2024/25, “com espaço para crescer muito mais”, estima a Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa).
“O algodão do Egito tem uma das melhores qualidades do mundo. Agora, eles estão agregando e fazendo um blend com o algodão brasileiro. Se a maior referência em qualidade do mundo gosta do algodão brasileiro, significa que estamos no caminho certo na questão de qualidade”, afirmou Alexandre Schenkel, presidente da Abrapa, durante uma visita organizada pela entidade à Fazenda Pamplona, da SLC Agrícola, em Cristalina (GO). A propriedade cultiva mais de 8 mil hectares de algodão e está em fase final de colheita.
Os cotonicultores brasileiros já visitaram empresas egípcias para “costurar” melhor esses laços comerciais nos últimos meses. Segundo Schenkel, o resultado das exportações ao Egito é significativo. O mercado pode ser uma vitrine importante para a consolidação do Brasil no cenário mundial.
“Eles [egípcios] estão procurando parceiros, porque a indústria deles está crescendo, querem parceiros seguros e estratégicos para serem fornecedores nos próximos anos com algodão de qualidade e responsabilidade”, disse.
O cenário de produção no Brasil evoluiu nos últimos 25 anos, período em que o país saiu de segundo maior importador de algodão — após o bicudo quase dizimar a produção nacional — para maior exportador mundial da pluma, posto alcançado após o embarque de 2,68 milhões de toneladas entre agosto de 2023 e julho de 2024. Tudo isso em um área menor que a cultivada até os anos 1980.
Os produtores brasileiros sabem que a manutenção do país no primeiro lugar do ranking de exportadores da pluma depende de vários fatores do mercado. Mas primeiras estimativas apontam para a consolidação brasileira na liderança em 2024/25.
Relatório da Abrapa divulgado na semana passada diz que, “para a nova safra, as projeções indicam que o Brasil vai se manter como primeiro colocado no ranking”. Para o período comercial de 2024/2025, a projeção é de um aumento de 6,7% nas exportações, para 2,86 milhões de toneladas, segundo a Associação Nacional de Exportadores de Algodão (Anea). O Departamento de Agricultura americano (USDA) estima embarques de 2,72 milhões de toneladas.
A safra atingiu a metade da colheita e deverá ser novamente recorde, com 3,67 milhões de toneladas da pluma, impulsionado pela alta de 19,5% da área neste ciclo, para 1,99 milhão de hectares.
Para Schenkel, muito além de disputar e vencer a concorrência com outros países produtores, a estratégia é promover e incentivar o consumo de algodão no mundo. A indústria têxtil global tem impulsionado sua produção, mas baseada em fibras sintéticas, espaço que os cotonicultores querem ocupar novamente.
“O principal objetivo é motivar que se use algodão. Assim, vamos aumentar a participação no mercado. Podemos aproveitar a eficiência que temos no Brasil e aumentar produção e exportação. Temos que incentivar o uso de algodão no mundo”, disse. “Temos uma das melhores fibras do mundo para atender indústrias têxteis e temos responsabilidade social e ambiental nas fazendas”.
O cultivo de algodão ocupa apenas 0,2% do território brasileiro, observou o diretor-executivo da Abrapa, Márcio Portocarrero. Mais de 80% da produção nacional (2,55 milhões de toneladas) é certificada para boas práticas socioambientais nacionais, com o programa ABR (Algodão Brasileiro Responsável), e pela Better Cotton Initiative (BCI), a principal chancela internacional para o segmento.
Atualmente, 374 fazendas têm a certificação ABR. São 183 itens avaliados nas propriedades.
O Brasil também é o maior exportador de algodão certificado pela BCI. Foram 1,98 milhão de toneladas embarcadas na temporada 2023/24. Boa parte da produção abastece a indústria nacional (720 mil toneladas), que é a sétima maior do planeta e a maior produtora de jeans.
Segundo Portocarrero, além de abastecer o mercado têxtil, as lavouras de algodão impactam na produção de alimentos e na geração de empregos. Mais da metade do volume colhido é caroço, que vira farelo para ração animal e óleo, usado para fabricação de biocombustíveis e para alimentação. “O óleo é usado para a alta culinária, sem deixar traço ou sabor na comida”, disse. A fibrilha, extraída do processamento do caroço, é usada para confecção de tapetes e até papel moeda.