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Júlio Cézar Busato: ‘Só vejo bons tempos para a agricultura’

08 de Setembro de 2021

Descendente de italianos, o agrônomo Júlio Cézar Busato, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), foi o primeiro de sua família a desbravar o oeste da Bahia. Gaúcho nascido em Casca, ele buscava um lugar para expandir a produção agropecuária, até então restrita à cidade natal.



A decisão lhe ocorreu enquanto cursava a Universidade de Passo Fundo (RS), quando percebeu que só alcançaria o crescimento desejado em Mato Grosso ou na Bahia. Depois de conhecer os dois Estados, optou pelo cerrado baiano.



A mudança para Barreiras aconteceu em 1987. "Era um ambiente bastante inóspito", relembra Busato, que partiu sozinho, deixando a mulher e um filho pequeno, os quais buscaria meses depois. "Me enfiei no meio do mato. Um lugar sem luz, sem telefone, sem televisão, sem água, sem escola, sem hospital. Foi um tempo bastante difícil, mas muito bom."



A primeira terra da família Busato no Estado foi uma área arrendada. A soja, principal cultura produzida hoje no Brasil, foi a cultura escolhida. Depois, quando conseguiram implementar técnicas de irrigação, plantaram feijão, milho pipoca e algodão — o carro chefe da propriedade.



Atualmente, o Brasil é o principal produtor mundial de algodão em áreas secas e está entre os cinco maiores exportadores e consumidores. Entre agosto de 2020 e julho de 2021 — ano comercial de venda do algodão —, o Brasil exportou 2,4 milhões de toneladas da pluma de algodão — como é chamado o algodão comprado em farmácias e utilizado na fabricação de roupas. O número é 23% maior que o registrado na temporada anterior e marca um novo recorde. Conforme o mais recente relatório da Companhia Nacional de Abastecimento, as perspectivas para a próxima safra (2021/2022) são positivas.


"Todo dia a gente acorda de manhã tentando fazer melhor do que fez no dia anterior, sempre buscando produtividade, sempre buscando sustentabilidade", contou Júlio. "Nós temos de entregar para os nossos filhos, nossos netos uma terra melhor do que aquela que nos foi entregue. Esse é o objetivo."



Para isso, toda cadeia atende a rígidas regras de qualidade, rastreabilidade e sustentabilidade. Um exemplo é o programa SBRHVI (Standard Brazil HVI), que tem como foco padronizar a classificação do algodão e informatizar o acesso aos dados. A iniciativa iguala os processos brasileiros aos realizados em outros países produtores. Já o Sistema Abrapa de Identificação (SAI), criado em 2004, monitora e rastreia o algodão por meio de etiquetas com sequência numérica de código de barras que são fixadas nos fardos.



Para ganhar o título de Algodão Brasileiro Responsável (ABR), os associados da Abrapa precisam cumprir 178 itens de responsabilidade, com práticas sociais, ambientais e econômicas. "Estamos tirando algodão lá do fundo da loja e trazendo para a vitrine, dando transparência", disse. "A rastreabilidade do Sistema Abrapa de Informação permite saber onde cada fardo foi produzido, por quem foi produzido e em que local foi beneficiado. O ABR cuida da parte de sustentabilidade."


Antes de assumir a presidência da Abrapa, Busato fez parte da Associação Baiana dos Produtores de Algodão, do Fundo para o Desenvolvimento do Agronegócio do Algodão e da Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba). "Com a criação da Aiba, começamos a nos organizar melhor e fizemos parcerias com a Embrapa, universidades públicas e privadas e fomos visitar outros países", afirmou. "Essa busca pela tecnologia faz com que a Bahia tenha a maior produtividade de soja e milho do Brasil e a maior produtividade de algodão não irrigado do mundo."


Como o senhor avalia o atual cenário para o produtor de algodão?


Primeiro, vou falar como eu vejo o mercado, não só para o algodão, como para o milho, a soja e as carnes. O Brasil tem uma grande oportunidade de pegar o mundo pela barriga. Temos muita terra e usamos hoje menos de 8% do nosso território para produzir. O potencial de crescimento é enorme, principalmente nas áreas de cerrado, respeitando todo o Código Florestal Brasileiro. Se perdermos essa oportunidade, alguém vai pegar, talvez a África. No caso do algodão, em função da produtividade, da qualidade e da escala, podemos nos tornar o maior exportador mundial. Hoje, somos o segundo, atrás apenas dos Estados Unidos. Resumiria tudo numa única palavra: oportunidade.



E o senhor acredita que essa oportunidade está atrelada à tecnologia?


Com certeza. Para crescer, precisamos de rentabilidade das culturas e mercado. Rentabilidade vem de produtividade, do controle do custo de produção e do preço. No preço não conseguimos interferir, porque é a lei da oferta e da procura em nível mundial. Mas, na produtividade, sim, porque ela está atrelada à tecnologia. Todo dia a gente acorda tentando fazer o melhor que fez no dia anterior, sempre buscando produtividade, sustentabilidade. Temos de entregar para os nossos filhos e netos uma terra melhor do que aquela que nos foi entregue. Esse é o objetivo. Para aumentar a produtividade, melhoramos a fertilização e a matéria orgânica do solo. Precisamos usar mais defensivos agrícolas de origem biológica — ou seja, insetos, fungos e bactérias que controlam as doenças e pragas das culturas. O Brasil hoje é campeão. A variedade de sementes melhoradas também ajuda bastante. Tenho certeza de que a nossa tecnologia vai avançar cada vez mais e mais rápido.



À frente da Abrapa, como o senhor pretende trabalhar para que o país se torne o maior exportador mundial de algodão?


Estamos desenvolvendo dois grandes programas: o Sou de Algodão e o Cotton Brazil. Nosso objetivo é conquistar novos mercados e valorizar a pluma do algodão brasileiro. Para isso, temos um programa que checa a qualidade da fibra nos laboratórios brasileiros, e também focamos em sustentabilidade. A cultura do algodão tem de ser rentável para aqueles que trabalham em toda a cadeia produtiva. O produtor também precisa cumprir todas as normas do Código Florestal Brasileiro, ou seja, preservar 80% da sua propriedade na Amazônia, 35% no cerrado da Amazônia e 20% no cerrado, além de outras regras. Temos feito isso muito bem. Só vejo bons tempos para a agricultura brasileira, principalmente para o cotonicultor.



Como é feita a rastreabilidade do algodão?


Hoje, ainda é um leitor de código de barras, mas em pouco tempo será um QR Code. Assim, será possível ir até a loja, escanear o QR Code com o celular e encontrar toda a história daquela peça. Quem produziu, inclusive com uma foto da família produtora, onde, informações sobre a qualidade das fibras e em que local ele foi beneficiado. Da separação da fibra do caroço, passando pelo feitio do fio, pela costura, até chegar à prateleira da loja. Tudo isso certificado. Isso faz parte do programa Sou de Algodão, que a Abrapa está conduzindo. Vamos começar com duas marcas neste ano e passar para outras em 2022.



Os brasileiros têm noção da dimensão e da importância do agronegócio?


As pessoas precisam conhecer mais o que o Brasil tem de bom, e o algodão brasileiro eu diria que é uma das coisas que temos de melhor. Muitas vezes as informações chegam distorcidas. Na década de 1970, a maior população do Brasil estava no campo. Hoje, só 13% da população está no campo. Mesmo assim, essa gente consegue produzir alimento em quantidade, qualidade e a baixo custo tanto para a população brasileira quanto para a mundial. Os agricultores trazem riqueza para o país.



Revista Oeste – Por Sabrina Nascimento – 03.09.2021


https://revistaoeste.com/revista/edicao-76/julio-cezar-busato-so-vejo-bons-tempos-para-a-agricultura-brasileira/

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